A força das mulheres: varzinas dão aula de cidadania e amor à cidade

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Ana Lúcia e Maria Lima atualmente cultivam mais de 100 mudas em um terreno público. A ideia das mulheres é estimular mais pessoas a preservarem o meio ambiente; disposição é a palavra de ordem no canteiro montado do Jardim Satélite

 

O relógio marcava quase meio-dia, na terça-feira, 29 de agosto. O sol brilhava forte sem nenhuma nuvem no céu, em um dia quente de temperaturas altas em Várzea Paulista. Uma cena chamava a atenção: o entusiasmo de duas mulheres que capinam um terreno íngreme em meio ao forte calor.

 

O terreno em que elas atuavam próximo ao centro da cidade (ao lado do escadão da Rua Júpiter, no Jardim Satélite, com a Rua João Netto) reserva uma dose de esperança. Cercado por paletes de plásticos, brota ali, em um cantinho escondido, um grande exemplo de cidadania.

 

As boas vindas

 

 

 

Em um pedaço de madeira, uma placa improvisada. A frase simples dispensa correções ortográficas; o recado, de coração, verdadeiro e muito importante, alerta sobre a necessidade de preservar o meio ambiente para as gerações vindouras.

 

A cama que virou porteira: para conhecer o local, é necessário cruzar um pequeno portão de madeira. Restos de uma cama adaptada e improvisada se tornaram a porta de entrada.  Se antes era preciso cuidado para se desviar de entulhos dispensados irregularmente, o cenário atual é bem diferente. A atenção agora está voltada para não errar o passo e pisar em uma das mais de 100 mudas do novo local.

 

Assim que “driblamos” os canteiros de salsinhas, coentro, batata doce, alface roxa, encontramos uma das responsáveis pela mudança radical do local. Ana Lúcia Lourenço Santos, aos 55 anos de idade, carrega uma enxada pesada (2 kg) e faz a limpeza do terreno, mesmo sob o sol do meio-dia.

 

 

A conversa de início foi bem tímida. Do diálogo nasceu a confiança e era fácil notar em seus olhos o olhar de esperança: uma senhora de fala serena que carrega ensinamentos, mãe de três filhos e avó de cinco netos. A varzina de coração, moradora da cidade há 33 anos, boa parte deles no Jardim Satélite, cozinheira, não encontra obstáculos para dividir sua rotina da vida doméstica, do trabalho em um restaurante com o serviço de cidadã. Todos os dias, faça chuva ou sol, antes de ir à cozinha onde trabalha, faz questão de cuidar das plantações que fez em um terreno público em frente à sua residência. “Aqui antes era um depósito de lixo. Todo dia eu me deparava com alguém jogando entulhos. A Prefeitura limpava e, em menos de um dia, estava tudo sujo novamente. Eu não aceitava mais isso. Foi quando me juntei com a minha cunhada e decidimos manter o local limpo. Faz bem pra gente e para o bairro”.

 

Legado para as próximas gerações

 

 

Com uma disposição de dar inveja a qualquer um, a moradora revela que os frutos colhidos vão bem além e fazem bem para a alma. “Estar aqui me faz pensar não só em mim, e sim em todos moradores dessa cidade. Quando cultivamos o bem, colhemos o bem. Temos que cuidar com amor do nosso município, pois é a extensão de nossa casa”, completou a Ana Lúcia.

 

 

A tarefa pesada é dividida diariamente com a cunhada, Maria Lima Santos Conceição, que topou o desafio. Entre as mudas plantadas, uma lista extensa: banana nanica, maçã, roça de milho, mamão, batata, graviola, repolho, alface, manga, tomate já em fase de produção e até um pé de cacau.

 

O suor que escorre pelo rosto são os pequenos sinais de que a batalha não é simples. A viseira é o único acessório para se proteger do sol. Mesmo assim, dona Maria de Lima não esconde a satisfação de ver o local totalmente transformado. “Eu antes via de tudo aqui, inclusive ratos, escorpiões. Muitas pessoas não têm consciência coletiva, simplesmente jogam o lixo e não se importam com as consequências. Isso tem que mudar”, destacou a moradora, que foi colhendo algumas folhas de manjericão para preparar o tempero do almoço, enquanto revelou sua maior motivação para continuar a cuidar da cidade. “Mexer na terra é algo valioso. Não vejo a hora passar e me faz bem estar aqui. É uma terapia e também quero passar essa lição de cuidar de nosso meio ambiente para meus quatro filhos, além da minha neta”.